quinta-feira, 20 de agosto de 2020

135 anos do nascimento de Arthur Vilaça: Um grande benemérito de Minas Gerais


Há 135 anos nascia um dos grandes ícones de nossa história regional. Nosso papel é relembrar todos aqueles que ajudaram na construção das nossas sociedades, afinal sabemos que somos frutos de uma rede de momentos históricos e herdeiros da história.

A história de Itaguara, Crucilândia e Itaúna são muito próximas - disso já sabemos. Mas algumas personagens digamos emblemáticas, aproximaram ainda  mais as nossas histórias. As três cidades beneficiaram-se da trajetória de Artur Vilaça e se orgulham de sua profícua existência. A seguir, compartilhamos texto de autoria do saudoso amigo e intelectual itaunense Guaracy de Castro Nogueira:

Prefeito itaunense e grande benemérito

Conhecido como Coronel Arthur Contagem Vilaça. Não o considero “coronel” segundo a antiga versão política, pois foi um inovador. Nesta biografia, pretendo dar-lhe o verdadeiro reconhecimento, já que temos uma perspectiva histórica para julgá-lo, longe das paixões políticas e daqueles que teceram comentários sobre sua presença marcante em nossa cidade. Quero de início, relatar um episódio raro de sua conduta, como líder autêntico.

Desde 1922, o Brasil vinha sendo sacudido por um verdadeiro frenesi revolucionário. Em Minas, Antônio Carlos estabeleceu o voto secreto, fundou a Universidade e liderou um grande movimento de renovação. Em Itaúna, os políticos tradicionais apoiavam o presidente Washington Luiz, saudado na convenção que o elegeu pelo brilhante deputado federal por Minas, o itaunense Dr. Mário Matos. A política do coronelismo oficial, em 1929, já havia escolhido, como candidato e futuro presidente, Júlio Prestes, que vinha fazendo boa administração em São Paulo, apoiado pelos governadores de 17 Estados. Antônio Carlos articulou a candidatura de Getúlio Vargas, tendo como seu companheiro de chapa João Pessoa, presidente da Paraíba. Surgiu a Aliança Liberal com o triângulo Minas, Rio Grande e Paraíba, para enfrentar o governo federal e os outros estados. Como de costume, os coronéis fraudaram a eleição em favor do candidato oficial. Aconteceu a Revolução de 1930. Em Belo Horizonte o 12.º R.I., depois de vários dias de luta, rendeu-se à Polícia Mineira.

Em Itaúna, Arthur Vilaça ficou ao lado das forças revolucionárias, organizou com jovens políticos locais, ente eles o Dr. Lima Coutinho, Juca Santos e Dr. Hely Nogueira, um pelotão para combater as forças tradicionais da República Velha. Minas colocou-se de pé. Surgiram a “Coluna Libertadora”, os Batalhões “Antônio Carlos”, “Olegário Maciel”, “Raul Soares”, “Mario Brant” e “Artur Bernardes”. Vilaça hipotecou apoio a Getúlio Vargas e como ato significativo denominou nossa praça principal de João Pessoa, assassinado em Recife. Em 24 de outubro Washington Luiz foi deposto e a 3 de outubro empossado Getúlio Vargas. Foi o fim do regime instituído em 1891. Registre-se que Artur Vilaça, anteriormente, foi vereador no período de 1.º de maio de 1912 a 1.º de janeiro de 1916 e, depois, Presidente da Câmara e Agente Executivo para o mandato que se iniciou em 17 de maio de 1927, com apoio das forças tradicionais do Partido Republicano Mineiro (nos municípios os nomes dos partidos tinham coloração local), praticamente único partido oficial, que dominava a política itaunense desde os tempos do Dr. Augusto Gonçalves de Souza Moreira. Nessa legislatura, os demais vereadores do município eram Dr. Mário Matos, Dr. Dario, Dr. Lincoln e Zezé Lima e havia mais quatro vereadores dos distritos.

Com a vitória da Revolução, Olegário Maciel continuou no governo do Estado e nomeou Artur Vilaça como o primeiro Prefeito Municipal com este título. Continuou administrando o município com isenção, dignidade e operosidade, sem usar dos poderes que tinha nesse período revolucionário, respeitando os direitos inalienáveis de cada cidadão. Os que perderam seu mandato se sentiram traídos; este acontecimento foi um divisor de águas na política local. Vilaça exerceu o mandato por 9 anos, 6 meses e 11 dias; permaneceu no cargo até 28 de janeiro de 1936, quando foi exonerado, a seu pedido, pelo Governador Benedicto Valadares. Getúlio que prometera reconstitucionalizar o país em 1936, implantou o Estado Novo em 1937, governando como ditador. Artur Vilaça, amigo dos antigos membros da Aliança Liberal, os que se tornaram signatários do famoso “Manifesto dos Mineiros”, entre eles Pedro Aleixo, Jonas Barcelos Corrêa, Bueno Brandão, Mário Brant e tantos outros, entrou no partido de oposição, UDN, que provocou a queda do regime e deu uma Constituição Democrática ao País, em 1946.

Artur Vilaça nasceu em Dom Silvério, hoje Crucilândia, na época pertencente a Bonfim, em 20 de agosto de 1885, filho de Henrique Ferreira Vilaça e Francisca Álvares de Abreu e Silva. Estudou no Colégio Dom Bosco, de Cachoeira do Campo e no Colégio Azevedo, de Sabará. Diplomou-se em farmácia pela tradicional Faculdade de Farmácia de Ouro Preto, em 5 de dezembro de 1903. Era descendente da famosa Joaquina de Pompéu, tronco de ilustres personalidades mineiras, sua trisavó. Faleceu em Itaúna, terra que muito amou, em 18 de maio de 1955.

Casou-se, em 30 de maio de 1906, em Itaguara com Maria das Dores de Oliveira Campos, a Dona Dorica. Ao final de suas vidas se tornariam grandes beneméritos em Itaúna e em Itaguara, terra natal de Dorica. No mesmo ano de seu casamento, Vilaça transferiu-se para Itaúna, estabelecendo-se com uma farmácia que dirigiu por mais de vinte anos.

Como Prefeito, Vilaça embasou seus mandatos no trinômio: comunicação, saúde e educação. Concluiu o importante serviço de abastecimento de água potável e a rede de esgotos, iniciados na administração anterior. Introduziu melhoramentos nos serviços telefônicos, bem como investiu na melhoria do aspecto urbano da cidade, com a construção dos jardins do antigo Largo da Matriz, em conformidade com projeto técnico do alemão Steinmetz, inaugurados em outubro de 1929. A conservação e a construção de estradas vicinais, ligando a sede aos povoados do município, mereceram sua especial atenção. Ampliou e reformou escolas.

Em sua administração, em 1928, inaugurou-se a primeira agência bancária em Itaúna, do antigo Banco Comércio e Indústria de Minas Gerais, vendido ao Nacional. Foi um dos fundadores do Banco Industrial de Minas Gerais, depois vendido ao Banco Mercantil. Instalou uma agência de seu Banco em Itaúna e deu a Crucilândia sua primeira agência bancária.

Foi o Presidente da Sociedade Anônima que construiu o prédio da Escola Normal. Em 1930, graças aos esforços de sua administração, com o apoio do deputado federal Mário Matos, conseguiu sua oficialização. O deputado foi cassado pela Revolução e seu mandato estenderia até 1932. Como Arthur Vilaça apoiou Getúlio, Mário Matos jamais o perdoou, o que motivou a desoficialização da Escola Normal em 1938. “Valadares tinha no seu governo, na Diretoria da Imprensa Oficial do Estado, justamente Mário Matos que, automaticamente, começou a comandar politicamente o Município de Itaúna, bem como a exercer expressiva influência sobre a estratégia governamental praticada por Benedicto Valadares”.

Arthur e Dorica não tiveram filhos, mas dedicaram todo seu afeto à família, amparando sobrinhos e parentes. Criou em sua casa a sobrinha Zoé Vilaça Lara, que se casou com Severino de Paula Lara, de cujo enlace nasceu dois filhos: Artur Lúcio e Magda Lúcia. Artur Lúcio Lara, nascido em 1945, casou-se com sua conterrânea Idalina Dornas Diniz Lara, de tradicional família itaunense. Tiveram duas filhas: Tatiana e Larissa, residentes em Bocaiúva. Tatiana casada com Cláudio Antônio Caldeira Meira são os pais de Ana Cláudia e Artur. Idalina ficou viúva em decorrência do trágico acidente de automóvel que vitimou seu marido, ainda jovem, em 1976.

Magda Lúcia Lara Rocha, nascida em Itaúna sob o teto de Arthur Vilaça, em 1943, casou-se com Antônio de Oliveira Rocha Filho. Reside em Brasília, onde é extremamente requisitada pelos seus extraordinários dotes musicais. De seu casamento nasceram três filhos: Carmem Lúcia (falecida); João Paulo Lara Rocha, nascido e residente em Brasília, é analista de sistemas; Arthur Fernando Lara Rocha, itaunense de nascimento, casado com Raquel Montenegro de Oliveira Lara Rocha, residentes em Goiás. Ele é Piloto de Caça, Major-Aviador em Anápolis, onde pilota os velocíssimos “Mirage”; pais do neto de Magda Lúcia Lara Rocha: Arthur Fernando Lara Rocha Filho.

Desde quando chegara a Itaúna, o padre José Ferreira Neto queria instituir uma entidade para o ensino de meninos carentes, a Granja Escola São José. Pediu terras a três prósperos fazendeiros: José de Cerqueira Lima, Astolfo Dornas e Arthur Contagem Vilaça. Somente este anuiu ao seu pedido, disponibilizando-lhe dois alqueires. Mas o padre precisava de cinco e o sonho foi temporariamente adiado.

Antes de falecer, Arthur Vilaça solicitou à esposa, Dorica, que honrasse o seu compromisso com o Pe. José Neto. A generosa viúva, espelhada no exemplo de vida do esposo, foi mais além: doou 13 alqueires de seu melhor terreno e parte de sua fortuna, tornando-se instituidora da Fundação Granja Escola São José. Do gesto inicial de Arthur Vilaça sobrevive hoje a Granja Escola São José, instituição modelar, que acolhe dezenas de jovens estudantes tirados da rua, transformados em homens livres, plenos de cidadania, os líderes de amanhã, na Itaúna de nossos sonhos!

REFERÊNCIAS:Texto: Guaracy de Castro Nogueira (In memoriam)
Pesquisa: Charles Aquino, Patrícia Gonçalves Nogueira.
Organização: Charles Aquino
Acervo: Instituto Cultural Maria Castro Nogueira
Fotografia: Adilson Nogueira

sexta-feira, 14 de agosto de 2020

Universidades Públicas e Humanidades Sob Ataque

 Compartilho artigo escrito para o Jornal Cidades, publicado em agosto de 2020


Universidades Públicas e Humanidades Sob Ataque 


Alisson Diego * 


Outro dia recebi, em um respeitável grupo de Whatsapp, um vídeo produzido pela empresa Brasil Paralelo, uma produtora de extrema-direita conhecida por espalhar fake news e ligada ao estarrecedor “gabinete do ódio bolsonarista”. O filme visava grosseiramente a ridicularizar, ofender e atacar levianamente as universidades públicas brasileiras. Dentre outras insensatezes, o malicioso  vídeo diz que o Brasil não possui importância no contexto universitário global e coloca as universidades brasileiras como sendo de qualidade duvidosa. 

Como disse, o grupo de Whatsapp em questão é composto por pessoas idôneas e, até que se prove o contrário, honestas e trabalhadoras. Quando recebo conteúdos tão maliciosos oriundos de “pessoas de bem”, forço-me à indagação: o que leva pessoas assim a compartilharem esse tipo de publicação distanciada da racionalidade? 

A pergunta acima é tão somente retórica. Não ouso respondê-la porque demandaria tempo e espaço em demasia, mas, apesar de todos os problemas, percalços e riscos que a manifestação de opinião envolve, não posso deixar de ser assertivo neste momento para asseverar: cuidado, você que compartilha vídeos ofendendo as universidades públicas, está sendo manipulado. 

Uma coisa é se discutir as concessões de bolsas da Capes (Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior), o financiamento estudantil e o próprio papel das universidades públicas na sociedade brasileira contemporânea e outra coisa completamente diferente é o ataque puro, simplório e genérico às universidades públicas. O real objetivo desses ofensores consiste na privatização do ensino superior brasileiro e não em buscar melhorias para o ensino público. 

Uma das principais perguntas que devemos nos fazer quando recebemos qualquer conteúdo pelas redes é: de quem é a autoria? Se não tiver autor definido já é forte o indício de manipulação ofensiva, caluniosa, injuriosa e difamatória, ou pura e simples fake news, como queiram nominar. Entretanto, no caso examinado, há autoria definida: o Brasil Paralelo, que surgiu em 2016 e se notabilizou por produzir dezenas de vídeos alinhados ao extremo conservadorismo, responsável, inclusive, pela disseminação de mensagens falsas sobre fraudes nas urnas eletrônicas nas eleições presidenciais de 2018, desmentidas incisivamente pelo Tribunal Superior Eleitoral (TSE) e verificadas pelo “Fato ou Fake” e outras iniciativas de checagem e validação de informações disseminadas no submundo das redes. 

De volta à temática do vídeo, digo de antemão que acho de bom tom colocarmos em pauta sempre a questão das universidades públicas e o seu papel no desenvolvimento do estado brasileiro. Ressalto que posso discorrer confortavelmente sobre este assunto, desprovido de quaisquer vieses partidários ou interesses pessoais. Jamais recebi um centavo de bolsa da Capes mesmo estudando por 7 anos em duas universidades públicas (UFMG e UFSJ), fui aprovado em processos seletivos sem qualquer cota e também obtive notas muito acima dos 600 pontos no Enem – outro aspecto questionado pelo vídeo é que nos cursos de ciências humanas são aprovados candidatos com pontuações abaixo dos 600 pontos. Ainda que eu tivesse sido bolsista em alguma universidade pública ou tivesse sido aprovado pelo sistema de cotas ou mesmo houvesse obtido menos de 600 pontos, nada disso invalidaria quaisquer de meus argumentos apresentados neste texto, mas nunca é demais ressaltar essa minha condição de absoluta imparcialidade argumentativa porque muitos tentam desconstruir argumentos com esses falaciosos ataques que acabam por confundir muita gente ingênua. 

Pois bem, de onde vêm então os ataques às universidades públicas? Essa é uma questão-chave para se compreender melhor a questão central deste texto (veja que há uma diferenciação enorme entre críticas aceitáveis e construtivas de ataques levianos e grosseiros). O Brasil Paralelo é apenas um instrumento de ofensores maiores. Via de regra, aqueles que atacam as universidades públicas são os mesmos que atacam as cotas raciais e de renda, e que no fundo não querem mesmo é ver negros e pobres ascendendo social, cultural e economicamente . Portanto, estamos diante de mais um problema tipicamente brasileiro: as velhas desigualdades sociais, o racismo e o preconceito disseminados frente as oligarquias e o seu arraigado pensamento patrimonialista e exclusivista diante do estado. “Se o governo não serve aos meus interesses, o governo não serve”, grosso modo, é assim que pensam. 

Especificamente, sobre as universidades brasileiras, é inequívoco dizer que elas precisam de amplas melhorias e reformas, sobretudo em sua infraestrutura, justamente neste momento histórico em que está em curso um claríssimo projeto de sucateamento das universidades estatais, capitaneado por pessoas que enxergam a educação como uma simples mercadoria, ignorando o papel central que devem ter no desenvolvimento nacional. 

Sobre a qualidade do ensino superior público, importante abordar os rankings universitários mundiais, mencionados no dito vídeo. Em primeiro lugar, é preciso ser dito que há dezenas deles; ao escolher um como parâmetro, deve-se conhecer pormenorizadamente os seus critérios. Tomemos como exemplo o índice avaliativo da Times Higher Education (THE), divulgado há poucas semanas. Segundo THE; entre as 20 melhores universidades da América Latina, 13 são brasileiras, com a Universidade de São Paulo (USP) em segundo lugar e a Universidade de Campinas (Unicamp) em terceiro, seguidas pela Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG) e pela Universidade Federal de São Paulo (Unifesp). O ranking avalia aspectos como pesquisa, ensino e transferência de conhecimento. O Brasil é o país com o maior número de instituições que atingiram o critério para serem avaliadas no ranking regional, com 66 no total, seguido por Chile (30) e Colômbia (23). 

Ainda sobre rankings, vale mencionar dois deles que levam em conta a relação “universidade e sustentabilidade”. Há pelo menos dois ranqueamentos internacionais que testam o comprometimento das academias nesta temática. A Universidade de São Paulo aparece no top 20 das duas listas, Impact Ranking e Green Metric. No primeiro ranking, a USP é a 14ª melhor do planeta. No segundo, está na 18ª colocação. As duas classificações obedecem a critérios diferentes. O Impact Ranking utiliza os 17 ODS (Objetivos de Desenvolvimento Sustentável), estabelecidos pela Assembleia Geral das Nações Unidas em 2015. Com base neles, observa-se: pesquisa, divulgação e governança. Além da USP, outras instituições brasileiras estão presentes no top 100 da lista. A Universidade Federal de Lavras (MG) está na 29ª posição, a Universidade Positivo (PR) ficou no 73º lugar, e a Unicamp (SP) se classificou na 80ª colocação. Já no Impact Ranking, a outra representante do Brasil entre os 100 melhores é a Universidade Estadual de Londrina (PR). Todas públicas neste ranking com exceção da Universidade Positivo. 

Este debate público é iluminado pela Constituição da República. Destaca nosso texto constitucional que o ensino superior deve promover o desenvolvimento humanístico, científico e tecnológico do país (art. 214, V, da CF/88), dentre outros objetivos. Dispõe ainda a nossa Carta Magna a respeito da garantia de ingresso no ensino superior de estudantes de classes sociais menos favorecidas, dando a eles o direito de continuarem os seus estudos, atingindo os níveis mais elevados do ensino. Importa dizer que a educação superior não visa apenas ao preparo do indivíduo para o mercado de trabalho, mas promover o pensamento reflexivo, valorizar a responsabilidade social, a cultura e os valores humanísticos, além de estimular a produção do novo conhecimento. Quando isso não ocorre, a nação fica engolfada na lógica subdesenvolvimentista. Em razão disso, torna-se elementar que o Estado garanta às pessoas as condições de ingressarem no ensino superior. 

Conforme se vê, o debate é muito mais amplo do que parece e está obnubilado por questões nada republicanas e democráticas. Convém mencionar também que considero necessária uma reforma universitária que preveja a cobrança de mensalidades para estudantes abastados. A meu ver, nada mais justo – desde que os recursos sejam revertidos para a melhoria das próprias universidades públicas. Todavia, pode-se afirmar: o interesse desses senhores que atacam as universidades estatais não é e nunca foi a melhoria do ensino público, mas tão somente a mercantilização completa da educação e a financeirização e produtivização da vida. 

Não posso deixar de observar que é curioso que os ataques às universidades públicas venham, quase sempre, acompanhados de ríspidas ofensas aos cursos da área de humanas. Isso não se dá por mero acaso (ou por mera posição corrompida de um utilitarismo de ocasião), uma vez que são as humanidades que questionam a ordem vigente. Qual o papel da filosofia, da sociologia e das humanidades de forma geral? Qual o papel dos pensadores? Em síntese, consiste em transpor as limitações do pensar por meio da reflexão crítica acerca do ser humano, do mundo e da sociedade, valendo-se de métodos e análises filosóficos, sociológicos, antropológicos etc. Eles (os donos do poder e a elite brasileira) odeiam a crítica e não suportam questionamentos, sejam eles quais forem. Eles não toleram a diversidade e a existência de qualquer pensamento crítico. E é justamente o pensar crítico a razão mesma de ser da filosofia, da sociologia e das humanidades. Afinal de contas, de que vale a vida sem a reflexão, como se fôssemos robôs ou seres inanimados? 

Nunca é demais lembrar Sócrates que, pouco depois da decretação de sua sentença de morte, disse uma das frases mais célebres da história da filosofia e da humanidade – que é ao mesmo tempo uma admoestação e uma exortação: "a vida sem reflexão não vale a pena ser vivida”. 

Não vale mesmo. 


Alisson Diego Batista Moraes, advogado, bacharel em Filosofia pela UFMG, MBA em Gestão de Empresas pela FGV e mestrando em Ciências Sociais pela Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais. Foi prefeito de Itaguara entre 2009 e 2016.